À ESCUTA DO DIÁLOGO: ESVAZIAR-SE – Paulo Borges

 


À ESCUTA DO DÍALOGO: ESVAZIAR-SE

Sem dúvida que o diálogo inter-religioso e intercultural, bem como o encontro e o diálogo entre diversas espiritualidades são de uma atualidade premente.

A vida de Sidarta Gautama surge como símbolo de um necessário esvaziar-se, tendo em conta o facto de que, aos 29 anos de idade, abandonou o conforto do seu palácio e se esvaziou de tudo aquilo que, normalmente, constitui os anseios do ser humano. E tal esvaziamento e radical mudança de vida deu-se precisamente ao constatar a existência do dukkha (sofrimento) das Quatro Nobres Verdades. Vagueou pela Índia e, durante 45 anos, transmitiu aquilo que tinha descoberto. Pode dizer-se que o que Gautama Buda viu é que a forma como nós percecionamos o mundo é a raiz do sofrimento. O sofrimento radica na ilusão de haver uma separação entre mim e o outro, entre mim e a realidade. Daí a tentação do egocentrismo, concentrando-me nos meus próprios interesses e desejos, ignorando aquilo que são as forças do outro; daí, igualmente, o desejo possessivo e a aversão. A ilusão, o desejo possessivo (apego) e a aversão (hostilidade) são as três razões do sofrimento. Depois desta descoberta, fez o seu «Sermão de Benares» a um grupo de cinco ascetas.

Somos processos dinâmicos e tudo o que é impermanente é insatisfatório. Devemos esvaziar-nos da ideia de que encontraremos a felicidade em coisas transitórias. Nós não somos; nós inter-existimos: eu não existo separado dos outros. Forte dimensão de interdependência. Abertura ao amor ilimitado, que é o ideal do Bodisatva. Esvaziarmo-nos, para que possamos acolher em nós o sofrimento de todos os seres.

O que é a vacuidade? Nós somos contidos pelo espaço. O vazio é a plenitude. Semelhanças na mística do tibetano Longchenpa (1308-1363) e do Mestre Eckhart (1260-1328). A vacuidade como a natureza absoluta da realidade; espaço onde a nossa vida avança.

Abordagem budista como hipótese de trabalho, procurando ser o caminho do meio, entre extremos. O seu ensino como uma jangada que não exige apego.

Compaixão e sabedoria: as duas asas de uma ave. O esvaziamento leva-nos a um conhecimento de nós mesmos. Nós somos um espaço maior do que os nossos pensamentos.

Vacuidade e Deus. A intimidade de cada um de nós abre-se para o infinito. Vivemos todos uma realidade maior. Somos inseparáveis do espaço infinito.

Adelino Ascenso

Presidente dos IMAG


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